domingo, 1 de setembro de 2013

Sonetinho apaixonado

O que é que a paixão não faz
Com um coração solitário e quente...
Faz, do arisco, demente
Que dessa paixão se refaz.

É pela sede do tesouro
Que desbrava o pobre pirata
Compondo, em seu navegar, uma sonata
Que jura brotar do ouro.

Como não se apaixonar?
Se a vida impõe
A dura missão

Quero me realizar
Esse é o pirata que compõe
O sonetinho da paixão.

Murillo César
Sofrer poético

O destino poético de todo poeta é o sofrer!
É escravizar-se na atmosfera dos próprios pensamentos
para descrever, em larga escala, os
sofrimentos diminutos, como avião
sem asas, sustentado por quatro membros.
Almeja atingir os céus e buscar, em cada
estrela, as pistas que conduzem à mulher
amada!
Banhar-se na lua com as gotículas de luz,
reacendendo a esperança de uma noite
tépida. 
Olhando para o vazio na busca do
compreender hermenêutico do conteúdo
de todo o sofrimento poético.

Murillo César

Pego-me, muitas vezes, em pensamentos.
Tento desviá-los. 
Todavia, todas as trajetórias, que eles seguem, conduzem-me a você.

Murillo César
Objeto versus imagem


Diante do espelho, o homem é o suposto reflexo real da sua virtualidade insensata desprovida de sentimentalidade. Às vezes, observando os animais irracionais, pergunto-me: por que são eles tão racionais que os próprios 'racionais'? A evidência é clara como a manhã que ainda assim é generosa ao clarear a obscura 'racionalidade' humana.

Murillo César 
Coração metrônomo


Andava sem destino quando, de repente, inebriado, me vejo parado diante do mar em plena ressaca de março. Toda aquela movimentação das águas era como uma dança que se encaixava, perfeitamente, ao canto-lamento dos Orixás. Ondas que se quebravam nas pedras, gigantes ondas, agora, devoram-me a alma, rejeitando o corpo grosseiro envolto num lençol de areia. De súbito, vejo a Flor Amada passando ao meu lado, a uma distância impossibilitada de alcance. Ela arrasta, no andar, a Mata Atlântica análoga em um vestido verde e longo. Ah! A saudade roubou-me a racionalidade e deu margem a melancólica sentimentalidade poética. Enfim, tudo girava em torno deste corpo [perecível], no qual um instrumento ainda vivia, batia e chorava.

Murillo César
Joia de Ali

Olhou-me, sorriu
Uma flor em jardim cor de anil
Primavera passou, ninguém viu
Só eu a te esperar

Derramou o néctar do amor em mim
Beija flor, nosso amor é bem-te-vi!
Uma rosa encantada que eu mesmo colhi
Tão rara como joia de Ali

Ingênua menina em corpo de mulher
Despetalando rosas, mal-me-quer/bem-me-quer
E nessa brincadeira vou te amar
Até...

Derramar o néctar do amor em mim
Beijar a flor, ao nosso amor bem-te-vi
Uma rosa encantada que eu mesmo colhi
Tão rara como joia de Ali.

Murillo César
Decifrando os sonhos


Durante os sonhos, percebe-se o interesse, quiçá, do aparelho cerebral retornar ao processo de sequenciação das ideias sensitivas não encaixadas na linearidade temporal do presente, no momento em que deveria [o processo] cumprir a ordenação do funcionamento perfeito do cenário.

Murillo César
No tempo-espaço, perde-se o sujeito na ironia trágica dos poetas. E o medo? Teme a própria essência que perturba o homem na hermenêutica metafísica do desconhecido.

Murillo César
Noite

Deleita-te ao meu lado e desvela o desejo ardente do meu corpo
Deixa de ti cair os panos que revestem o teu olimpo e
torna exequível o amor selvagem.
Deixa-me jogá-la no horizonte e abri-te
à esfera ensandecida da sensualidade, fazendo-me
penetrar em teu corpo, tornando-o a parte perfeita do meu.

Murillo César
Tudo parece tão perfeito que a única perfeição espanta-se com algo não imperfeito. Os objetos aí estão tão perfeitos que até parece impossível a discussão acerca do que seja o imperfeito. Metafísica sublime, a perfeição move-se ao redor do seu próprio eixo perfeito. Mas, que será essa perfeição? Talvez o corpo escultural nos templos gregos ou pantheons? Não. Dir-lhes-ei: o homem, magnífica máquina orgânica, capaz de pensar e formular desejos expressos em linguagens, exteriorização de um pensamento estruturado. Mas, essa mesma máquina magnífica orgânica desliza sobre o 'óleo' impuro, vazado da imperfeita manutenção do essencialismo.

Murillo César